domingo, 12 de dezembro de 2010

Gaspari: Lisbeth Salander e a ação dos ‘wikihackers’


Ninguém se lembra. Mas houve um tempo em que a rapaziada movia-se a carroça: um Compaq 486, de 50 Mhz, com 16 Mb de Ram e winchester de 1.2 giga.

Os teclados atuais, dependendo do perfil de quem os pilota, podem ganhar a forma e a precisão de uma pistola Glock G.28, calibre 40.

Nos últimos dias, os adversários do sítio WikiLeaks testaram a pontaria de uma moçada com tempo e disposição para percorrer o saloon da web à procura de encrenca.

O repórter Elio Gaspari desencavou na literatura a inspiração que move esses personagens que eletrificam o universo virtual dos dias que correm.

Vai abaixo o texto que abre o cardápio servido por Gaspari em sua coluna deste domingo (12), na Folha:


“Os maganos da Amazon, do Mastercard, da Visa e do PayPal tentaram asfixiar o WikiLeaks e foram surpreendidos por uma revolta que juntou dezenas de milhares de micreiros, atacou seus portais e derrubou alguns deles.

Na Holanda, foi preso um ‘wikihacker’. Tem 16 anos. À força dos poderosos contrapôs-se a mobilização dos teclados da internet.

O mundo do sucesso cibernético produziu figuras legendárias como Steve Jobs e Mark Zuckerberg, mas os ‘wikihackers’ vêm de outro universo, onde há algo de transgressor.

Por mais que haja ‘wikihackers’ pensando em virar Jobs ou Zuckerberg, quem eles admiram mesmo é Lisbeth Salander.

Com seis piercings só na cabeça e um dragão tatuado nas costas, ela é a micreira antissocial, introspectiva e malvada dos romances do sueco Stieg Larsson, autor da trilogia ‘Millenium’ (25 milhões de livros vendidos).

Salander foi magistralmente interpretada por Noomi Rapace no filme ‘Os homens que não amavam as mulheres’.

Gótica, cerebral e emburrada, come o pão que o diabo amassou, mas seus trocos são dolorosos. Uma das desforras faz do Capitão Nascimento um pacifista.

A barreira do seu individualismo só é removida quando liga o computador, com o qual faz o que quer.

Ambígua até na sexualidade, Salander não é uma personagem que estimule a clonagem, mas todo hacker tem um pouco de Lisbeth.

A prosperidade dos anos 50 e a fé no poder da tecnologia ajudaram o escritor Ian Fleming a construir a figura de James Bond.

O poder que a gregariedade da internet dá hoje ao individualismo criou os ‘wikihackers’ e Lisbeth Salander.

Bond deixou atrás de si alguns tiques, um modelo de pasta e mais nada. O ataque aos portais da Amazon, do Mastercard, da Visa e do PayPal ensinou a essas empresas onipotentes que atrás de cada monitor não está apenas um freguês.

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Escrito por Josias de Souza às 05h52

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